Imagina como será quando tivermos um filho. Tu grávida, eu grávido também e a tua mãe, que já não é nova, de barriga arrebitada, grávida também. Grávida como nós, sim, grávida neste casamento a três, duas mães, um pai.
Imagina, o bebé a aprender as primeiras palavras a imitar tudo o que vê e ouve. Ele a dizer
Mãe
ele a dizer
Pai
ele a imitar os olhos de carneiro mal-morto da tua mãe. Não quero um filho com olhos de carneiro, muito menos mal-morto. E a tua mãe a ensinar o bebé a dizer
Podias ajudar mais em casa, pai
e tu, sem ligares muito, cansada, esgotada de cuidares de uma criança, cuidares de mim, cuidares da casa e cuidares da tua mãe. Havemos de falar os dois, explanar a necessidade de a tua mãe estar aqui em casa todos os dias, a mandar palpites, como quem anda à pesca, a provocar-me, a sorrir-me com desdém, cada vez que passa pelo corredor, aqueles olhinhos de carneiro mal-morto, a dizerem
Um dia destes levo a minha filha
e eu cheio de medo que o olhar se transformasse em feitos e tu desaparecesses da minha vida, a tua mãe te levasse, com medo que eu não cuidasse de ti, com a certeza dela que eu não sou homem para ti, que não te trarei um futuro bom.
Havíamos de falar. Não aguento mais a tua mãe, nem os olhos de carneiro mal-morto. Não aguento mais um casamento a três.