Monthly Archives: Novembro 2006

Crónica de um Louco

São sorrisos alienados. São provocações descomedidas. São corpos que se unem. São toques que se calculam. São vozes ao ouvido. São cheiros de cabelo. São perturbações desregradas, que não importam no momento. São prazeres momentâneos. São arrepios de pele. São acordos de lascívia. São desejos excessivos. São respirações descompassadas.

São… crónicas de um louco. Um louco que te amou e que nem com desafios te consegue esquecer.

Céu, estrelas e arco-íris [Divagações de uma mente inquieta]

Há momentos como este em que o coração me dói e a minha alma se sente de uma cor acinzentada.
Estou sentado à secretária, mas as minhas mãos estão brancas, brancas de tão frias que estão. Parece que as letras não se querem juntar. Vejo ali um A e acolá um O. Vejo também um R com um ponto no fim. E algures num canto, encontra-se um M. Palavras soltas como “Amor” e “Felicidade” estão espalhadas na mesa.
Perguntam-me o porquê; perguntam se as palavras me doem.
Não, o que me dói é não conseguir juntá-las; pensar que são incompatíveis.
A minha mente diz-me “Esquece”, mas o meu coração lembra-me das promessas, dos pactos e dos planos para o futuro.
Ah! Se eu conseguisse voltar ao céu que criaste e refazer tudo de novo… Já tenho tudo pensado na minha cabeça! Vou mudar aquela nuvem dali para o canto oposto, retiro aquele pedaço de nuvem cinzenta, espremo todas as outras para que sequem as lágrimas e depois com um pincel concebo o céu tal como tu gostas, com pontinhos de luz a que poderia chamar “estrelas” ou “pontinhos de felicidade” coloridos da cor do arco-íris. E qual é a cor do arco-íris, afinal? O arco-íris é rosa! A tua “cor preferida, mas oculta por vergonha”, disseste-me tu uma vez.
Com a ajuda do cinzel da paixão, esculpi para ti o meu amor. Esse amor, para mim, tem o formato de uma estrela. Olho para ti como se fosses a sua personificação! E és! Tenho a certeza disso, por mais que digam que não. Eu não sou cego, vejo-te brilhante e luzidia. Vejo-te como um alvo a atingir no futuro. Vejo-te como uma estrela e por isso tenho a certeza que, por mais que tente, nunca mais me vais cair na vida outra vez e que, mesmo subindo pela escada da perseverança até ao Universo, estarás sempre a milhões de anos-luz! Aliás, é isso mesmo que as estrelas fazem. Já fui a tua estrela também, sei o que é isso. E como todas as estrelas, tive o meu fim. Antes de a estrela desaparecer, ela fica muito, muito brilhante, até que finalmente se extingue como num suspiro. Extingui-me na forma de luz e surgi na forma de cores. Mas isso não significa que seja um derrotado. Lutei. Lutei. Lutei para me manter aceso e apesar de não o conseguir, hoje surjo no arco-íris. Vês? Sou aquele que está sentado na risca verde!
Pena que o teu arco-íris seja cor-de-rosa…

Histórias do Mar

Enquanto ela saboreava a luz do sol, a areia conhecia todos os seus segredos. Foram intermináveis as horas em que ela se deitava sobre a areia e as ondas lhe beijavam o ventre. Elas recordavam o doce daquele ventre esguio e sabiam de cor todos os recantos.
Ela costumava deitar-se e contar histórias de embalar ao mar. Cada onda que vinha, era uma recordação e uma lembrança. Enquanto passeava pela praia, sentiu o gosto do metal debaixo da sua pele. Baixou-se e encontrou um pendente de ouro, com a forma de estrela. Com os seus gestos cândidos e inseguros, colocou-o ao pescoço. Rapidamente, a sua mente ficou ocupada em imaginar as histórias por detrás. Os sonhso vividos, as promessas feitas, os beijos trocados.
Enquanto pensava nisto, deixou-se embalar pelo som do mar…

Retrato de Angústia

Era aquela fotografia que a angustiava. Um retrato de família que a fazia sentir deslocada. Cada vez que o olhava, ela desfazia-se e abandonava-se a um pranto desesperado. Ela não sabia de onde nasciam os soluços que lhe sacudiam o peito.
Ela via a figura de um pai grisalho, amoroso e com uns olhos que davam uma sensação de segurança. No entanto, via também uma mulher com o rosto marcado pela vida, uma face franzida e severa. Era esse contraste que a apoquentava. Uma família dividida e uma menina vestida de seda cor-de-rosa no canto da fotografia. Ela sempre foi considerada como a mais desprovida de atributos entre os irmãos. Não tinha um talento inato para a música ou uma capacidade precoce para as palavras. Era uma simples menina e comum para a sua idade. Mas isso não chegava e era-lhe exigida perfeição.
Sabia que tinha de se livrar dessa sensação de angústia. Tirou do bolso da saia a velha fotografia de família, acendeu um fósforo e encostou-o à ponta do papel, que se incendiou. Então deixou-o cair e ficou a olhar para ele, até que se transformou num pequeno monte de cinzas que um sopro de vento levou para longe.

Futuro Sombrio

Vivemos num mundo sem crianças, onde todos estão tristes e receosos. Não há crianças para seguir o nosso caminho, para correr nos lugares em que brincamos… A esperança pela qual vivemos está a desvanecer-se. É tempo de todos nós dizermos “Boa Noite”. Se fores o último dos vivos quando o fim chegar, lembra-te de desligar a luz.

Gelo

Num dia cinzento, próprio de quem não sente a alma, crio um lago gelado. Um cubo gélido. Glacial. Indiferente. Como é que a vida nos conduz a este estado nu e cruel? A chuva deixa de cair. O sofrimento congelou o sentimento. As lágrimas copiosas que caíam no meu rosto mísero terminaram o seu percurso. O culminar de uma fase.
Oiço o bater da porta. O rufar dos tambores. Anúncio de uma vida melhor. Sorriso luzidio. Olhos brilhantes, próprios de quem ama. O medo próprio de um recomeçar. Como eu gostava de cercar a tua alma. Entrar no teu seio e pressentir que me pertences. Que eu te pertenço. Quem me dera poder andar no meio da tua consciência. Mas não! Sento-me na fronteira; na barreira intransponível que tu própria criaste. Sinto-me longe. muito longe. A chuva torna a cair. Lágrimas. Gelo. Medo.

Quero ser um pássaro

Sinto-me preso a algo sem futuro. Sinto-me preso ao teu amor, à tua ânsia de querer, ao teu sentimento de posse. Não quero ser cruel! Faz-me bem estar ao pé de ti. A tua presença completa o vazio e a confusão da minha mente. Tu és uma espada de dois gumes. Preenches-me. Sufocas-me. Sinto-me feliz. Sinto-me abafado. Não consigo definir o que sinto. É o jogo do tudo ou nada. Não quero viver assim. Não quero estar longe de ti. Não quero estar demasiado perto. Eu sou assim. Sou efémero. Sou breve, fugaz e passageiro. Quero ser livre. Ser um pássaro. Largar tudo. Ser liberto. Poder voar por outros mundos. Eu não vivo preso a ninguém. Estou livre. Só quero ficar. Só quero partir. Não quero a tua pressão. Assim, fujo e esqueço tudo. Sair agora e correr o mundo. Quero ser um pássaro.

Águas Passadas

As nuvens encobriam os primeiros raios de sol da manhã. O mar estava revolto e a praia deserta. Um homem reformado fazia um passeio matinal. Os pés próprios de quem trabalhou toda a vida, tocavam na areia molhada. As ondas beijavam-no.
Ao longe, um molho de águas verdes confundiam-se com o azul-marinho do mar. Uma onda arrastou-as para junto dele. Afastou-as com o pé. Sentiu algo pesado. Olhou: um corpo de mulher boiava à beira-mar. O seu olhar límpido fitava o céu, como quem pedia uma oportunidade ao mundo.

O Fim da Linha

Ela passeava pelo asfalto. A temperatura do chão queimava cada pegada sua. Caminhava com uns sapatos vermelhos na mão. O seu andar era débil e decrépito. Cada passo dado era uma fuga às responsabilidades. Cada suspiro era uma parte da sua alma que se soltava. O modo como o seu olhar se prendia no firmamento era revelador da sua ansiedade e da necessidade que tinha em avançar no tempo. Esquecendo a sua vida e as pessoas de quem amava, ela corria. Corria sofregamente, à espera de encontrar o fim da linha. Uma gota de suor escorria pela sua face. Confundia-se com as suas lágrimas. Lágrimas de despedida.
Correu. Passou por uma ponte. Pareceu-lhe um escape para outra dimensão. Os carros circulavam. Ela passava ao seu lado. Olhou o rio. As luzes dos candeeiros de rua reflectiam a sua índole.
Desprendeu-se da vida. Abriu os braços. Precipitou-se para o rio. Durante o salto, ouviu um murmúrio surdo. Eram as vozes da sua consciência inquieta.

A Colcha de Retalhos

Numa tarde de Verão, debaixo de uma árvore, à beira rio, encontrava-se um menino. Os seus olhos brilhavam, tal como o reflexo do sol de fim de tarde nas águas calmas. Com as mãos disfarçadas atrás das costas, escondia as saudades que sentia do seu avô. Lembrava-se de um homem velhinho, que passou as últimas semanas da sua vida deitado numa cama, à espera que a morte o viesse buscar. Mas não se lembrava sequer de o seu avô verter uma lágrima de tristeza por saber qual o seu destino. Ele nunca falava de morte. A sua imaginação comprazia-se em coisas simples, cenas, episódios, com os quais se divertia.
Morreu meses depois, também numa tarde de Verão, quando os raios de sol, passando através das persianas, pareciam acariciar a colcha branca da cama. Mas o menino, continuava a ouvir a sua voz amiga, apenas ligeiramente rouca e continuava a ver o seu belo sorriso, compreensivo e bom.
Foi ele quem o ensinou que, com um pouco de imaginação, ninguém está completamente só. Nunca se esqueceu do que ele lhe disse naquela tarde: “A vida é na verdade feita de pequenos episódios, como uma colcha de retalhos. Só importa que em nenhum desses retalhos caiba um remorso demasiadamente grave, ou um arrependimento demasiadamente amargo…”
Ainda hoje, ele continua a crer que a beleza ou a miséria de uma vida dependem sobretudo disto…

A Razão da Minha Escrita

É um momento absoluto. Um momento de consagração entre a minha alma e a minha mente. Um momento de silêncio total. Um momento em que me entrego ao papel e sinto o aroma das palavras. A tinta começa a ganhar sentido e a definir o meu espírito. Esta é uma terapia através da qual a minha alma ganha contornos. Um momento sem censura, a não ser aquela que é auto-imposta. Momentos mágicos em que deixo a imaginação fluir e em que o discurso não tem de ser necessariamente lógico ou racional. É a minha lógica, a minha razão. Percebi que não as tenho e não me custa reconhecê-lo… Sou um simples rapaz. Vivo pequenos episódios. Sozinho. Eu e as palavras.

Quem és verdadeiramente?

A meio da noite acordo de um sonho. A claridade da lua ilumina a minha face. Ecos na minha cabeça transformam cada sussurro num grito. Sonhei que podia voar pelo céu azul generoso e azul, sobre esta cidade agitada, seguindo-te sobre as copas das árvores, sobre a linha do metro, sobre as pessoas ansiosas que correm na calçada. Tentaria descobrir quem és verdadeiramente.
A meio da noite, com suores frios pelo corpo, na cama e com a janela aberta, fito o firmamento e penso em tudo o que disseste, quem és verdadeiramente.
Quem me dera poder voar agora, dar voltas sobre esta cidade, sobre o chão manchado de cinza. Seguiria o teu rumo, por portas entreabertas, para tentar descobrir quem és verdadeiramente.

Nu

Nu. É como me sinto por vezes. Nu de sentimentos, emoções, desejos e ambições. Ausente de personalidade e de vontade. Simplesmente assisto à passagem da vida, como um simples transeunte sentado na calçada. É incrível como nos esquecemos rapidamente das outras pessoas. É espantoso como outros olhares nos enlaçam. É extraordinário como facilmente entramos num jogo. É inacreditável como mudamos de mentalidade. É indecifrável como às vezes me sinto promíscuo. Nu de moralidade, decência ou pudor.
Olho ao redor, finjo ter calma, mas a solidão apressa-me. Quem sabe se cometo uma loucura? Ninguéme stá a olhar… Já não escondo a pressa.
Vou bater na tua porta de noite… nu…

O Princípio

Fui o primeiro homem na tua vida.
O primeiro que soube os teus sonhos e os teus desejos. Fui o primeiro que provou o sabor dos teus beijos deliciados no ardor da paixão. Conheço cada recanto do teu corpo e como levar-te ao céu. Cada beijo imperfeito roubado no suor do desejo foi uma conquista. Os teus caprichos foram satisfeitos por mim. Senti-te por dentro e percebi que eras unicamente minha. Abracei-te como se abraça o tempo.
Levaste-me o perfume de todas as noites…

A Morte nos Braços

Sinto a lua nas minhas mãos. Tenho vontade de mudar o mundo. Tu que jazes nos meus braços e fitas o céu com um olhar mórbido, foste a minha lua durante muitos anos; a minha sensação de poder. Sentia que tu me pertencias e que o teu corpo era meu. Sentia-me dentro de ti. Amava e era amado. Não consigo definir o sonho, mas sei que ele une as pessoas e os locais até formarem um só. Sei que poderíamos ficar para sempre neste local. Sozinhos. Agora contigo imóvel nos meus braços, fecho os olhos. Deixo-me levar. Sinto o teu corpo no meu. Sinto a leveza da lua nas minhas mãos.

Prenúncio de Morte

Ouvimos o canto das cotovias no azul imenso e ainda mal percebemos o som das armas e das explosões ao sul da nossa terra. As papoilas florescem vermelhas no campo; talvez um prenúncio do nosso futuro. Nós somos os Mortos. Jazemos nestes campos. Agora passamos-te a nossa tocha, para que a ergas bem alto, como se fosse tua, para que as cotovias possam voltar a cantar e as papoilas a crescer…

Jogo de Sedução

Eu avisei-te que não era uma pessoa fácil: manipulo as pessoas ao meu gosto. Pedi para que tivesses cuidado comigo, que não insistisses em me dar carinho. Tanta vez que eu desejei que não me amasses. Eu não queria que sentisses prazer com o meu corpo. Gosto de brincar contigo. Quero usar-te e deitar-te fora. Quero saciar todo o desejo da minha carne. Quero sentir prazer egoísta. Vou perder-me no teu corpo e deixar-te. Vou amar-te por uma noite. Quero ser satisfeito. Quero que me sirvas. Vou despir-te. Deixar-te sem alma. Exigi que me extinguisses o ardor. Pressionei-te. Forcei-te. Eu avisei-te.